domingo, 17 de outubro de 2010

A política como circo

Gabriela Pujol Bell Fernandes – educadora).

As eleições vão ao encontro do que o povo escolhe. Escolhas que são de extrema importância para o futuro de uma nação e que refletem exatamente como o povo pensa e vê a causa pública. Justamente por isso é que elegeu o palhaço Tiririca para representá-lo. Infelizmente elege-lo pode significar exatamente como o povo vê a política no nosso país, talvez como um grande circo.
Um circo no qual o povo, como público, assiste aos espetáculos dos atores principais, os políticos, como uma verdadeira comédia em que não existe nenhuma verdade no que se faz. No entanto, esse grande espetáculo político, que acontece no nosso país, em nenhum momento foi representado por cidadãos vestidos como palhaço e usando nariz de palhaço. Por isso, eleger o candidato Tiririca talvez tenha sido a forma escolhida, pelo povo, para caracterizar verdadeiramente a política que acontece diante dos nossos olhos.
Essa política que muitas vezes nos aparece totalmente descomprometida com a causa pública. Os números que elegeram esse candidato, que pode ser cassado por ser analfabeto, refletem que, o povo, mesmo assistindo à sua propaganda eleitoral, em que ele foi questionado sobre o que faz um deputado e respondeu que quando chegasse lá, descobriria, pode ter acreditado nessa fala como uma verdadeira piada de palhaço num espetáculo do circo.
Sendo assim, quem está mais descomprometido com a causa pública? Um candidato, que para representar o povo, o faz como palhaço; o povo que não discerne sobre quem vai representa-lo, ou os políticos atuantes que representam o país e permitem os grandes espetáculos escandalosos com a imagem pública e, com isso, influenciam o povo a não acreditar mais na política como algo extremamente importante à construção da cidadania e assim, manutenção da vida?
Pensar na eleição, usando como exemplo o candidato citado acima, é ir ao encontro do que aconteceu aqui em Petrópolis, em que candidatos muitas vezes já eleitos em nossa cidade não tiveram votos satisfatórios, pois talvez já estejam fora do alcance do que o povo precisa. Isso nos leva ao questionamento sobre o que se faz com a causa pública. Qual a imagem que se quer formar? Para o filósofo Nietzsche, “para o espetáculo da vida entreter, é importante que seja representado. Para isso, são necessários bons atores”. Por isso, é pertinente a necessidade dessa representação pública, ser sim, verdadeira. Ir ao encontro do que o povo necessita. Quando um candidato se preocupa com a sua imagem no sentido de construí-la a fim de que transmita ao Outro, confiança de que será capaz de proporcionar uma interação que vai ao encontro das necessidades, está apto a si aprimorar muito no verdadeiro sentido da política.
Sendo assim, candidatos como Tiririca que precisam de personagens para dar vida à sua carreira pública e política no país, representando o povo, teriam uma interação melhor se usassem como tema principal de seu espetáculo, o que vai ao encontro do que o povo precisa, pois assim, tornariam o grande palco de circo em que se transformou, infelizmente, a política brasileira, num grande espetáculo.
Dessa forma, sejamos todos, políticos verdadeiros na representação da vida, a fim de que o espetáculo seja muito bem representado e aceito pela platéia que o assiste, pois tudo aquilo que é bem construído, com bases fortes e seguras, tende a estar firme no maior propósito que é a vida. Piadas são facilmente esquecidas pois num primeiro momento podem ir ao encontro de questões pertinentes ao cotidiano, no entanto, não se encontram com o que se precisa. O que se fixa no cérebro humano, é o conhecimento que desestrutura para estruturar o que precisa ser apreendido, como propôs Jean Piaget, assim como Vygotsky e todos outros com suas teorias sobre educação, principalmente ligadas à construção baseada na interação de quem aprende com o que se é aprendido.

Artigo publicado na Tribuna de Petrópolis em 14.10.2010

O mal da humanidade

(Gabriela Pujol Bell Fernandes – educadora)

A humanidade, o conjunto de homens, existe porque há a necessidade da vida. Existe nas relações dentro da necessidade de manutenção da sua própria existência e da existência de outras espécies em total dependência. Essas relações acontecem de acordo com as disposições de cada ser sobre aquilo que se busca. Por isso, os homens se relacionam da forma como melhor sabem fazer. E, é justamente sobre essa forma de se relacionar com o Outro, que Freud afirmou ser o mal da humanidade, a falta de afeto.
Em suas teorias psicanalíticas ele mostra que transferimos às relações nossos desejos. Buscamos o Outro e, no Outro, aquilo que precisamos para dar sentido e consagrar a nossa existência. Desde que somos concebidos existimos num meio social no qual nos constituímos sujeitos, e recebemos o que esse meio pode nos fornecer, crescendo assim, de acordo com essa estruturação física, psíquica e social.
Apreendemos o mundo através da nossa família e nos baseamos no contato com eles, como o exemplo de criança, jovens e adultos que seremos na vida. Por isso, pensar na colocação de Freud sobre o afeto é ir ao encontro de questões sobre as relações humanas serem boas ou ruins, complicadas ou saudáveis, e assim como cada um caracteriza a convivência com o Outro.
Dentro dessa perspectiva, vale o questionamento sobre como conduzimos a nossa vida. Temos afeto com aqueles que fazem parte da nossa caminhada? O que é ser afetuoso e transformar assim as nossas relações sociais?
O afeto é algo tão nobre quando se tem na mente o desejo de querer o bem e estar bem. Não é fácil, principalmente quando se cresce em um ambiente tão hostil sem qualquer palavra, gesto ou atitude que signifique confiança, apoio, respeito, enfim, o que representa o gostar, o querer estar próximo, o perceber a outra pessoa nas suas características e possibilidades.
Na perspectiva freudiana sobre esse assunto, a primeira relação, mais importante na vida de qualquer pessoa, é com a mãe. A pessoa que desde o início fornece e dá sustento à primeira necessidade que é a vida. Quando nasce, a forma como é amamentada e assim, desenvolve-se recebendo os cuidados com higiene, acalentada quando sente frio, dor, desamparo, cresce e assim, recebe afeto das pessoas da família como propôs Freud (1974) com a “Teoria da Transferência”, “as crianças até os seis anos de idade firmaram-se nas suas relações com as pessoas do mesmo sexo e do sexo oposto, achando-se mais ligada pelos pais, irmãs e irmãos. Um rapazinho está fadado a amar e a admirar o pai, que lhe parece ser a mais poderosa, bondosa e sábia criatura do mundo. Na segunda metade da infância, dá-se uma mudança na relação do menino com o pai – mudança cuja importância não pode ser exagerada. Descobre que o pai não é mais o poderoso, o sábio e rico dos seres; É nessa fase do desenvolvimento de um jovem que ele entra em contato com os professores, de maneira que agora podemos entender a nossa relação com eles. Transferimos para eles o respeito e as expectativas ligadas ao pai onisciente de nossa infância e depois começamos a tratá-los como tratávamos nossos pais em casa”.
Não só trataremos assim os professores, mas todas as outras pessoas e dessa forma, nos relacionaremos com o mundo. No livro “Mulheres que amam demais”, Robin Norwood coloca essa questão da seguinte forma: “existem vários tipos de famílias desajustadas, como famílias de alcoólatras, famílias violentas ou incestuosas, mas todas apresentam um efeito comum em crianças que nelas crescem: são crianças prejudicadas, até certo ponto, em sua capacidade de sentir e relacionar-se. Muitas vezes nos surpreendemos fazendo coisas que nossos pais faziam, as mesmas atitudes que prometemos a nós mesmos nunca ter. Isso ocorre porque aprendemos através de suas atitudes e até de seus sentimentos, o que é ser homem ou mulher”.
Sendo assim, ser afetuoso todo dia. Entender que não se pode mudar o passado, mas o futuro precisa ser diferente e temos condições de iniciar essa mudança hoje, no presente das nossas relações, construindo relacionamentos mais afetuosos, com mais demonstração de carinho, confiança, respeito, gestos que dão validade ao que o Outro nos mostra. Por vezes, temos perto de nós situações que realmente não precisariam acontecer então, sendo afetuosos com nossas próprias necessidades, respeitando as escolhas que formam nossa vida, saibamos transformar o mundo, que nos cerca e do qual somos tão dependentes, em um lugar mais pacífico e harmonioso.

Artigo publicado na Tribuna de Petrópolis – 4/10/10